Por Andrea Godoy
Na minha carreira de jornalista, através das reportagens sobre o movimento trabalhista, já “defendi” indiretamente a causa de diversas categorias. Defendi os motoristas e cobradores: dos baixos salários, jornadas extensas, surdez, devido ao longo tempo expostos a ruídos, bico de papagaio, por ficarem sentados dirigindo por muito tempo.
Defendi os bancários: do assédio moral, pela “pressão” para venderem produtos pouco lucrativos aos clientes, da LER-DORT (Lesão por Esforço Repetitivo ou Distúrbios Osteomusculares Relativos ao Trabalho), que os invalida ao longo da vida de tanto contabilizar o lucro dos banqueiros.
Até as classes mais abastadas de trabalhadores, como os médicos, foram defendidas por jornalistas como eu. As greves do Sindicato dos Médicos sempre ganharam ampla cobertura, como a de qualquer trabalhador, que merece respeito pelo suor que derrama.
Mas como jornalista, eu que abri a boca para defender todo mundo, sempre vivi “amordaçada”, com medo de defender as causas da minha classe para não perder meu emprego. É tão bom quando podemos ir a praça e clamar, chorar, abrir a boca e tornar a nossa situação pública, para que pelo menos, a sociedade conheça nossa luta. No entanto os jornalistas constituem uma das classes de trabalhadores mais oprimidas da sociedade.
Cansei de ver meus amigos trabalhando em dois, três, até quatro empregos (acreditem, isso existe!) para manter um padrão digno de vida. Cansei de ver amigos passando mal de tanto estresse. Com palpitações, sujeitos a problemas cardíacos, gastrites, úlceras.
Eu mesma trabalhei por três anos em dois empregos. Eram doze horas diárias de trabalho. Era literalmente “matar” um leão por dia. As conseqüências vieram a galope: acne na vida adulta decorrente do estresse e dois tipos diferentes de gastrite. Para quê? Para poder ganhar o salário referente a um emprego e poder fazer alguma coisa a mais do que simplesmente pagar os credores.
A ditadura acabou e os jornalistas não são mais levados para apanhar e morrer em porões. Mas outro mal se instalou na vida de quem deveria ter voz: a opressão imposta pelos patrões, que nos ameaçam com o desemprego diante de qualquer tentativa de abrir a boca.
Faraó e Moisés novamente se vêem frente a frente. “-Vocês jornalistas estão ociosos, por isso estão reivindicando aumento. Para que calem a boca, agora vocês também serão obrigados a dirigir o carro da reportagem,” dizem os patrões, nossos Faraós. Mais palha e feno para amassarmos no barro e construirmos suas fabulosas pirâmides....
Foram 400 anos de opressão para que Moisés se levantasse no poder de Deus e desse fim à escravidão do povo hebreu. Agora, nós jornalistas queremos também levantar a nossa voz assim como Moisés, na atual campanha salarial de nosso Sindicato. “-Deixa meu povo ir para me adorar..”.
Deixem os jornalistas clamarem. Deixem que eles tomem as praças e ruas e em uma só voz denunciem o que a sociedade não sabe: que o jornalista não tem um salário decente, que há mais de 10 anos está sem reajuste.
Jornalistas, ergamos a voz ! Que a Justiça do Trabalho seja como as 10 pragas contra os patrões. Que elas lhes obriguem a nos dar o mérito e o respeito que eles nunca nos deram !
3 comentários:
Interessante a comparação: o levante de Moisés e seu povo e o levante dos jornalistas.
Bj Keka
Ao longo da história, as lutas e batalhas se repetem. O grande mal da humanidade são o orgulho e o egoísmo, que cegam - e embrigam - principalmente quem tem oportunidade de estar perto do dinheiro e do poder. Assim como Gandhi, não acredito que a saída seja no campo da violência, mas no embate das idéias e da moralidade. O que falta nesse país do "jeitinho" é que o exemplo comece na nossa vida íntima, sem que nós mesmos não levemos - ou queiramos levar - vantagem sobre o outro. Para lutar por uma vida melhor e seguir o caminho do bem realmente é necessário haver renúncias pessoais e materiais. Alguém se habilita?
Renúncia, essa é a palavra. Nós, trabalhadores jornalistas, que já renunciamos tantas coisas nessa nossa jornada louca, sem horário certo, sem final de semana, muitas vezes sem férias de 30 dias - porque o patrão não contrata ninguém paranos substituir -, sem horário de almoço, etc, estamos novamente sendo forçados a renunciar um piso digno de R$ 2,1 mil - que foi o que a categoria entendeu ser digno - para tentarmos fechar um acordo com os patrões. E eles? o que renunciam? Até agora nada. Pelo contrário, nos apresentam essa proposta absurda, que nada mais é do que acúmulo de função e exploração, para que jornalistas dirijam os veículos de reportagem. E sabe quanto querem pagar por esse acúmulo de função? Nada!!!!
Querem é reduzir ainda mais o valor mínimo pago a um contratado de suas empresas. Porque o piso que eles estão nos oferencendo - de R$ 1,25 mil na capital e de R$ 950 no interior - nem mesmo eles praticam mais há tempos.
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