Classificado de “caixa-preta”, o cadastro dos donos de rádios e TV no país -onde estão os nomes de 56 deputados e senadores que são sócios ou têm parentes no controle de emissoras- passará a ser divulgado em caráter definitivo pelo Ministério das Comunicações.
O mapa, antiga reivindicação de entidades que tentam fiscalizar o setor, estará disponível a partir de segunda-feira (30/5) na página do ministério e pode ser acessado no site da Folha.com.
A lista, obtida pela Folha [de S. Paulo], já teve uma primeira versão divulgada em 2003, no governo Lula, mas foi retirada do ar logo em seguida por conta de pressões de políticos contrários à divulgação.
Pela legislação, o político pode ser sócio de rádio ou TV, mas não pode exercer cargo de diretor. A principal crítica é o uso das emissoras para alavancar candidaturas e prejudicar adversários.
O ministro Paulo Bernardo (Comunicações) chegou a defender a proibição de que políticos sejam sócios de emissoras, mas a aprovação dessa ideia é considerada inviável politicamente.
A publicação do cadastro faz parte de um conjunto de medidas a ser baixado pelo governo para combater irregularidades na área. Entre elas, o uso de laranjas para esconder o verdadeiro dono com o objetivo de venda posterior da concessão, como revelou a Folha em março.
“A publicação da lista vai dar transparência ao setor e combater a atuação de aventureiros, que usam laranjas só para lucrar com o negócio”, afirmou o ministro.
Presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia do Senado, Eduardo Braga (PMDB-AM) disse que a divulgação “abre a caixa-preta” do setor e forçará quem está na “clandestinidade a se regularizar”.
Partidos
Entre os 56 dos 594 congressistas que são sócios ou com parentes em emissoras, 12 são do PMDB, partido que presidiu o país durante o governo de José Sarney, quando houve farta distribuição de concessões em troca de apoio no Congresso.
Segundo partido na relação, o DEM, antigo PFL, tem 11 congressistas na lista. O partido foi aliado do PMDB no governo Sarney e comandava o Ministério das Comunicações com o senador Antonio Carlos Magalhães, cuja família controla um grupo de rádio e TV na Bahia.
A família de Sarney, presidente do Senado e aliado do governo Dilma, também controla um grupo de comunicação no Maranhão.
O cadastro traz um mapa das 291 TVs, 3.205 rádios e 6.186 retransmissoras comerciais existentes no Brasil.
O ministério espera que a lista, que será atualizada a cada dois meses, ajude a identificar irregularidades, revelando casos em que os verdadeiros donos de emissoras não são aqueles registrados oficialmente.
“Infelizmente, num universo de quase 10 mil concessões, é impossível fiscalizar tudo. Agora, porém, alguém poderá acessar a lista na sua cidade e descobrir que a rádio local é registrada no nome de um laranja”, afirmou o ministro das Comunicações.
Congressistas dizem que não são mais sócios
A Folha entrou em contato por telefone e e-mail com os deputados e senadores que estão na lista do Ministério das Comunicações. Alguns disseram não ser mais sócios, mas que a mudança ainda está em processo.
Por meio da assessoria, o deputado Alexandre José dos Santos (PMDB-RJ) disse que vendeu a rádio há dez anos e que não sabe por que o processo não foi regularizado.
O senador Gim Argello (PTB-DF) afirmou que vendeu sua participação na rádio em 96. “Não sei por que ainda não foi regularizado.”
O senador João Vicente Claudino (PTB-PI) disse que vendeu sua parte em 2007, quando assumiu o mandato.
O deputado Antonio Bulhões (PRB-SP) disse que as cotas em seu nome nas emissoras de rádios estão em fase de transferência na pasta.
Felix Mendonça Junior (PDT-BA) informou que sua participação foi transferida para familiares. Cesar Hanna Halum (PPS-TO) e Rodrigo de Castro (PSDB-MG) disseram que ganharam as concessões, são sócios-minoritários e até hoje as rádios não começaram a funcionar.
Já o deputado Fabio Loureiro Souto (DEM-BA) nega ser sócio da rádio em que aparece como acionista.
O ministério informou que existem mais de 35 mil processos em análise.
Governo vai modificar regras para concessão de emissoras
O governo vai mudar as regras das concessões de rádio e TV e passará a exigir que os interessados nas licitações comprovem capacidade financeira para bancar a montagem das emissoras.
Para isso, tomará duas medidas. Primeiro, subirá o valor do depósito de caução de 1% para 20% -exigência feita para habilitar um interessado a participar da licitação.
Decidido o vencedor da disputa, o Ministério das Comunicações exigirá que o pagamento pela concessão seja feito no ato e de uma só vez.
Antes, o vencedor pagava só metade do valor e ainda assim após a aprovação de seu nome (e projeto de emissora) pelo Congresso. A diferença era paga após um ano.
Desde que decidiu alterar as regras, o ministério suspendeu a abertura de novas licitações. Mesmo assim, cerca de 300 estão abertas pelas regras atualmente em vigor.
Braga disse que a comissão que preside já exige, na aprovação das concessões, que vencedores da licitação demonstrem capacidade financeira para montar as emissoras de rádio, antecipando-se às novas regras.
A medida foi tomada após a Folha revelar, em março, irregularidades em empresas que negociaram concessões públicas. De 91 empresas investigadas pela reportagem, 44 não funcionavam nos endereços informados ao Ministério das Comunicações.
Entre seus “proprietários”, constavam funcionários públicos, donas de casa, cabeleireira, enfermeiro, entre outros trabalhadores com renda incompatível com os valores dos negócios.
Educativas
O governo vai mudar também as regras de concessão de TVs e rádios educativas.
Hoje, elas só dependem de uma decisão do ministro. A partir de agora, terão de seguir critérios que estão sendo estabelecidos a partir de consulta pública. Haverá sistema de pontuação para definir vencedor.
“Sabemos de casos em que a rádio educativa acaba usada para fins comerciais. Vamos evitar que isso ocorra e dar preferência a universidades”, disse Bernardo. (VC e JW)
Fonte: Observatório da Imprensa, citando Folha de S. Paulo
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