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6 de fev. de 2008

Artigo

Por que os jornalistas negligenciam as comunidades?

* Por Keka Werneck

Diz o ditado: o que os olhos não vêem, o coração não sente. Talvez por isso que se danem os mortos no Iraque, porque não podemos sentir o cheiro de menstrução no ar, nem de sangue seco, que deve rondar aquele ambiente de guerra histórica. Tudo que está distante, em tese, é também menos urgente. Talvez por isso não surja em Cuiabá um movimento que clame contra a guerra do Iraque, para que parem já com aquela carnificina, que a gente só degustada num virar rápido de página entre a editoria de Política e Cidades. A página Internacional nos parece quase sempre bizarra. Afinal quem saca o mundo árabe, a não ser pela ótica limitada criada em torno daquela gente, de que é terrorista, de que é xiita e fanática? Nem nos interessa tanto escutar o grito surdo que aquelas mulheres de burca esboçam em fotos de beleza plástica. (A guerra é plástica). O grito! E quem chora o sepultamento de crianças iraquianas escangalhadas por balaços no peito? Eu entendo essa nossa negligência com relação a esses fatos distantes, e vamos embrulhando sabão com nossos jornais que contam a execução de 20, 30 mortos a cada dia, a explosão de mercados, de igrejas, o inferno no Iraque. Eu entendo essa negligência. Uma outra não! Não entendo.


Nas redações é costumeiro dizer que são de segunda linha as pautas nas comunidades. O jornalista pautado para cobrir "buraco de rua", esgoto, falta de água, seria menos preparado do que os que correm os corredores suntuosos dos tribunais de justiça, que frequentam o mesmo fórum dos políticos engravatados, dos que tentam tratar da cultura.

Não é o Iraque que nos cerca. O que nos cerca são comunidades pobres, nas periferias de Cuiabá. E lá morrem não iraquianos, mas brasileiros como eu e você, baleados, esgoelados, esfaqueados, esquecidos. Lá, a fome ainda vampiriza. Lá, o lazer é catar piolhos. Lá as mulheres estão sem trabalho e quando, por sorte e por azar, encontram, não há creches onde deixar os filhos. Lá, a mesa não é farta, como a do jornalista, que, embora empobrecido, encontra-se ainda espremido na classe média, em geral. A comida é, por uma semana inteira, arroz com água. E na outra semana, fubá com água. E na outra, feijão. Na outra, macarrão branco. Iguarias, como queijo e creme de leite, nunca. Alho e sal ao menos, só as vezes. Escola para os filhos, precárias. Saúde, é no postinho, nem sempre aberto. Às crianças, faltam brinquedos, que crueldade! Se nossos filhos podem, porque os deles não! Material escolar nesta época do ano, não tem. O racismo, contra o negro, que é a maioria da população, corta feito faca, meu irmão, não espera debates não, condena e mata. Nos presídios, vá lá ver. Só negros e pobres. Mais negros.

E daí é motivo de chacota essa outra carnificina, essa sim nossa e não iraquiana, que tanto mata de imediato quanto arrasta no sofrimento.

Os problemas comunitários são considerados menos importantes, pautas de segunda. A emergência de tantas almas, coisa de canto de página.

É assim ou não é?

Para essa negligência, só tem uma explicação. Os jornais não estão existindo para transformar, mas dar lucro. E cara de pobre, o preto, não vende jornal.
As pessoas querem é uma cidade que encubra essa barbárie, para que todos possam ir ao shopping center comprar e depois dormir sem culpa.

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